Vivemos uma acelerada Revolução Industrial 4.0, um progresso tecnológico que nos facilita a vida nas coisas do dia-a-dia e que chega agora a outros segmentos como os produtos culturais.

O respeito pelos Direitos de Autor (DdA) dos artistas não é tema novo e há mais de 20 anos que os avanços da Internet obrigaram indústrias como a da música a reconfigurar-se. Mas hoje estamos a dar um passo cujas implicações não estão acauteladas, mas a tecnologia, essa, já está aí.

Falo dos NFTs, a sigla para Non-Fungible Token (registo não fungível), um certificado ou selo de autenticidade digital que confere ao comprador a propriedade do ativo nesse formato. Estes ativos criptográficos assentam, como as criptomoedas, na tecnologia blockchain mas, ao contrário de moedas, são insubstituíveis porque a sua natureza única não permite a troca por outros ativos da mesma espécie.

Um bem representado por NFT pode ser imaterial (um tweet, meme, GIF, uma obra de arte digital, música, etc.) ou uma representação virtual de um bem material (uma pintura, imóvel, automóvel, etc.).

Um NFT é criado e disponibilizado em várias plataformas e registado numa blockchain, representando uma nova fonte de rendimento para os autores, que, ao criarem obras neste formato, as comercializam em ambiente virtual, mediante a concessão de licenças, adicionando royalties de forma automática aos contratos digitais firmados na sua venda.

Mas é a partir daqui que os problemas começam: é que não é possível rastrear as entidades que realizam estas transações, podendo qualquer pessoa utilizar um conteúdo de autor do qual não é titular, para criar um NFT indevidamente, comercializá-lo e lucrar com isso, tornando-se comuns os casos de fraude.

Deter um NFT não dá direito à propriedade do item associado nem confere a quem o comprou a propriedade intelectual do ativo representado. O DdA continua a pertencer ao autor da obra, a não ser que na venda do NFT esteja incluída a sua transferência para o adquirente. Ao autor da obra restará recorrer aos tribunais com a agravante de, na ausência de regulação, o desfecho a seu favor não estar assegurado.

Para acautelar esta situação, a União Europeia está a preparar o Regulamento de Mercados de Criptoativos (MiCA), um passo significativo na regulação dos criptoativos, quer a nível europeu, quer mundial mas, em Portugal, a regulamentação das criptomoedas ainda não é uma realidade, estando em curso um trabalho conjunto entre o Parlamento Europeu, o Governo Português e Banco de Portugal, focado na prevenção dos crimes de branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo. Mas a tecnologia, essa, está de vento em popa.

Enquanto esse desfasamento entre realidade e regulação não acaba, os juristas dedicados à defesa da propriedade intelectual e os tribunais vão ter muito trabalho, antes mesmo da criação da tutela jurídica da nova tecnologia, pelo que precisamos mesmo é de uma Regulação 4.0.