De acordo com a organização não governamental World Justice Project, Portugal ocupa a 7.ª pior posição em 126 países quanto ao tempo necessário para resolver problemas legais: 24 meses (730 dias). Este valor apenas é ultrapassado por Macedónia (26 meses), Trindade e Tobago (27,5), Albânia (28,0), Eslovénia (30,6), Guatemala (33,4) e India (35,0).[1]

Ademais, o Doing Business Report, elaborado pelo Banco Mundial, estipula que o tempo necessário para resolver um litígio por via judicial em Portugal é de 755 dias (enquanto em Espanha é de 510 dias, no R.U. 437, na Alemanha 499 e em França 395). [2]

Gráfico

De acordo com a Direção-Geral da Política de Justiça (DGPJ), a duração média das ações executivas findas em Portugal é de 51 meses (ou 1247 dias!).[3]

Neste contexto, como poderá Portugal cumprir com o 16.º Objetivo de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas – que visa “promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas a todos os níveis”?[4]

Como poderemos garantir um acesso à justiça para todos? Como é que o nosso sistema jurídico poderá funcionar como garante da convivência pacífica em sociedade e como motor do nosso desenvolvimento económico e social? Como é que poderemos estabelecer, nas palavras da Professora Gillian Hadfield, uma “infraestrutura legal”, i.e. “o conjunto de materiais jurídicos socialmente disponíveis que os agentes económicos podem utilizar para ajudar a gerir as suas relações”?[5]

Para tal, é primeiramente necessário que os cidadãos tenham um maior acesso à informação jurídica e que existam meios céleres para resolver os seus litígios.

Relativamente aos meios de resolução alternativa de litígios, os números revelados pelo mais recente relatório do Conselho Superior dos Julgados de Paz demonstram que a duração média dos seus processos é de 200 dias,[6] um número bem menor que os 730 dias referidos supra.

No entanto, este mecanismo de resolução de litígios, que para além de mais célere, é mais barato que o recurso à via judicial tradicional – pois a sua taxa de justiça tem um limite máximo de 70€ [7] – não se encontra ainda implementado em todo o território nacional:[8]

mapa mobile dispute resolution

Grandes centros urbanos como Braga, Faro, Viana do Castelo e Bragança não usufruem ainda deste mecanismo de resolução alternativa de litígios. Urgindo assim aumentar a cobertura nacional deste serviço.

Ademais, será necessário explorar como alternativa os meios de resolução de litígios em linha, i.e., a “Online Dispute Resolution”.

A Resolução de Conflitos em Linha consubstancia-se na utilização de tecnologias da informação, nomeadamente a Internet, para facilitar a resolução de um conflito entre as partes. Neste conceito incluem-se não só conflitos que tenham como origem transações em linha, mas também conflitos “offline” que poderão ser resolvidos num ambiente virtual.[9]

Diversas plataformas de ODR têm surgido no âmbito da resolução alternativa de litígios. Podemos citar, a título exemplificativo, a plataforma MyLawBc[10], desenvolvida no Canadá, que visa a prestação de informações legais e de apoio às partes envolvidas em conflitos familiares.

Ademais, tem surgido a reflexão sobre uma possível transição da ODR para a m-DR (mobile Dispute Resolution) ou m-CM (mobile Conflict Management).[11]

Em boa verdade, os telemóveis são atualmente o meio de comunicação mais utilizado à escala global, e têm atingido uma enorme penetração de mercado mesmo em países sub-desenvolvidos. Existem atualmente mais assinaturas de telemóveis móveis do que pessoas no Planeta.[12]

Face ao exposto, urge considerar a possibilidade da utilização de tecnologias móveis que possibilitem a conexão das partes independentemente da sua “literacia digital”.

Neste sentido, foi implementado na Austrália o Family Relationship Advice Line (FRAL),[13] que visa informar pessoas afetadas por problemas familiares, ao qual as partes podem recorrer gratuitamente, e para além disso, este serviço foi ligado ao Telephone Dispute Resolution Service[14] onde é prestado um serviço de mediação familiar através do telefone.

A tecnologia móvel permite desempenhar variadas funções no âmbito da resolução de um conflito: primeiramente, poderá ser uma forma de recolha de dados. No caso de um litígio relativo à delimitação de uma propriedade, um smartphone permite mapear as coordenadas GPS do território em litígio.[15] No âmbito da prova testemunhal, ou declaração das partes, esta tecnologia permite a sua recolha e gravação[16]. No decorrer da mediação, permite estabelecer uma comunicação assíncrona entre as partes.[17] E por fim, permite a fácil notificação da decisão às partes.[18]

[1] Cf. World Justice Project, 2017 General Population Poll survey module on legal needs and access to justice. Data collected by YouGov using a probability sample of 1016 respondents in the three largest cities of the country.

[2] cf. http://www.doingbusiness.org/content/dam/doingBusiness/country/p/portugal/PRT.pdf

[3] cf. http://www.dgpj.mj.pt/sections/siej_pt/destaques4485/estatisticas-trimestrais6456/downloadFile/file/Destaque_64_AExecutiva_4Trimestre2018_20190416.pdf?nocache=1556615794.47

[4]https://sustainabledevelopment.un.org/content/documents/15771Portugal2017_PT_REV_FINAL_28_06_2017.pdf

[5] Tradução livre de “the socially available set of legal materials that economic actors can use to help govern relationships“ em Gillian K. Hadfield, Law for a Flat World: Legal Infrastructure and the New Economy, disponível em https://law.bepress.com/usclwps-lewps/art114/

[6] http://www.conselhodosjulgadosdepaz.com.pt/ficheiros/Relatorios/Relatorio2018.pdf

[7] “  1.º    Por cada processo tramitado nos julgados de paz é devida uma taxa única de (euro) 70.”, em Portaria n.º 1456/2001.

[8] http://www.conselhodosjulgadosdepaz.com.pt/

[9] cf. Marta Poblet, Mobile Technologies for Conflict Management, Law, Governance and Technology Series VOLUME 2, Springer, p. 6

[10] https://mylawbc.com/info/lss.php

[11] cf. Marta Poblet, Mobile Technologies for Conflict Management, Law, Governance and Technology Series VOLUME 2, Springer, p. 9

[12] cf. ITU. Measuring the Information Society Report, Volume 1, p.5 em https://www.itu.int/en/ITU-D/Statistics/Documents/publications/misr2018/MISR-2018-Vol-1-E.pdf

[13] cf.  https://www.familyrelationships.gov.au/talk-someone/advice-line

[14] cf. http://www.raq.org.au/services/telephone-dispute-resolution-service

[15] Cf. Legal Design Lab, Stanford Law School, “What would an SMS-based dispute resolution system look like?”, October 25, 2012, disponível em http://legaltechdesign.com/access-innovation/how-can-mobile-tech-be-used-to-promote-justice-2/

[16] Idem.

[17] Idem.

[18] Idem.